Em Debate Especial
Abordando uma polêmica: Telecomunicações versus Audiovisual
Eduardo Prado
Consultor
Referências
[0] O GATS, similarmente ao GATT, tem como objetivo proteger a igualdade das oportunidades para as empresas no mercado doméstico, a despeito da suas origens e das origens dos seus serviços, como também, facilitando a progressiva liberação destes mercados. A metodologia e a estrutura do GATS, contudo, difere daquelas do GATT, desde que o objeto da regulação é serviço, essencialmente diferente de mercadorias. A Parte II do acordo do GATS compreende um número fundamental de “Obrigações e Disciplinas Gerais” que se aplicam a todas medidas pelos Membros que afetam a comercialização de serviços, com a notável exceção daqueles fornecidos no exercício da autoridade governamental.
O núcleo destas obrigações gerais é a obrigação denominada Most-Favoured-Nation (muito conhecida como MFN), formulada no Artigo II:1 do GATS. Para satisfazer esta obrigação MFN, é obrigado a acordar imediatamente e incondicionalmente com serviços e fornecedores de serviço de qualquer outro país Membro, tratamento não menos favorável desde que ele concorde em ter od serviços e fornecedores de serviço de qualquer outro país. Como estabelecido através do regulamento, o tratamento MFN implica em uma proibição de fato, como também uma discriminação através da lei entre serviços estrangeiros e fornecedores de serviço.
A Rodada do Uruguai (1986-1994) foi a 1ª Rodada da OMC a considerar na sua agenda os Serviços de Telecomunicações. Foi também nesta Rodada que foi criado o GATS focado em comércio multilateral de serviços. Antes só tínhamos o GATT focado em mercadorias. Depois da Rodada do Uruguai, temos a Rodada de Doha (Novembro de 2001 até hoje) que já começa a endereçar alguns tópicos mais evoluídos como a Convergência em telecomunicações.
[1] A categoria “Communications Services” é uma das doze categorias na Services Sectoral Classification List e é subdividida em cinco categorias: postal services, courier services, telecommunications services, audiovisual services e other.
[2] Services Sectoral Classification List, MTN.GNS/W/120, WTO, 10.jul.1991
[3] Communication from Switzerland, WTO, GATS 2000: Audio-Visual Services, S/CSS/W/74, paragraph 2, 04.may.2001.
[4] Idem a [3], seção 2.1.
[5] Não existe uma definição geral de Serviços Audiovisuais na lista de classificação W/120 mas existe uma enumeração de serviços. Nesta lista os Serviços Audiovisuais são classificados em seis sub-setores: “motion picture and vídeo tape production and distribution services”; “motion picture projection service”; “radio and television services”; “radio and television transmission services”; “sound recording”; and “other” (como serviços de tradução de filme e vídeo-tapes de uma linguagem para outra); Ver “Audiovisual Services and Their Subcategories in the GATS”, Patrick A. Messerlin/Stephen E. Siwek/Emmanuel Cocq, páginas 2-3 e em particular a Tabela 1 em “Audiovisual Services and their Subcategories in the GATS” (exemplar da Biblioteca do Google com visualização parcial); Ver Cultural Diversity and Regional Trade Agreements: The Case of Audiovisual Services, Silvia Fomentini e Lelio Iapadre, University of L´Aquila, Italy; Ver “Audio-Visual and Telecommunications Services: A Review of Definitions under WTO Law”, Paul L.G. Nihoul em Damien Geradin/David Luff (eds.) eds.), The WTO and Global Convergence in Telecommunications and Audio-Visual Services, Cambridge: Cambridge University Press, 2004, páginas 357-389, páginas 360-370. Ver também Seção 3.3.3 para uma crítica da “famosa” quebra de Serviços Básicos de Telecomunicações e Serviços de Valor Adicionado (exemplar da Biblioteca do Google com visualização parcial).
[6] PAUL L.G. NIHOUL idem a [5].
[7] The WTO, The Internet and Trade in Digital Products, Sacha Wunsch-Vincent, Oxford/Portland, Oregon: Hart Publishing, 2006, página 73 (exemplar da Biblioteca do Google sem visualização parcial de trechos); Para debate em relação a aplicação do GATT ou GATS, ver “Telecommunications and Audio-Visual Services: Considerations for a Convergence Policy at the World Trade Organization Level”, David Luff, Journal of World Trade, Vol. 38, No 6, 2004, páginas 1059-1086 e página 1073 e sequência.
[8] “International Trade Law and Broadband Regulation: Towards Convergence?”, David Luff, Journal of Network Industries, Vol. 3, 2002, páginas 239-271, e páginas 244-245; Ver “Audio-Visual Policy: The Stumbling Block of Trade Liberalisation”, Cristoph Beat Graber em Damien Geradin/David Luff (eds.) eds.), The WTO and Global Convergence in Telecommunications and Audio-Visual Services, Cambridge: Cambridge University Press, 2004, páginas 165-214, e página 200 e sequência (exemplar da Biblioteca do Google com visualização parcial).
[9] Sobre as dificuldades de classificar os produtos de Conteúdo transmitidos digitalmente no GATS, ver The WTO, The Internet and Trade in Digital Products, Sacha Wunsch-Vincent, Oxford/Portland, Oregon: Hart Publishing, 2006, na página 73.
[10] Ver, por exemplo o caso dos satélites, como discutido por Paul Hihoul aqui “Audio-Visual and Telecommunications Services: A Review of Definitions under WTO Law”, Paul L.G. Nihoul em Damien Geradin/David Luff (eds.) eds.), The WTO and Global Convergence in Telecommunications and Audio-Visual Services, Cambridge: Cambridge University Press, 2004, página 375 (exemplar da Biblioteca do Google com visualização parcial).
[11] Sobre o famoso Reference Paper do GATS:
Ver texto abaixo sobre o Quarto Protocolo que deu origem ao Reference Paper na referência: Telecomunicações: Condições do Brasil em Doha, Yi Shin Tang, Página 107, da publicação Comércio de serviços na OMC, Umberto Celli Junior (Coord.), Curitiba, Juruá, 2005.
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Malogradas as primeiras negociações para a abertura dos serviços de telecomunicações básicas, restou aos países criarem um Grupo de Negociação sobre Telecomunicações Básicas (GNTB) – logo substituído pelo Grupo sobre Telecomunicações Básicas (GTB)10 – encarregado de concluir um acordo específico até fevereiro de 1997. Um Anexo Relativo a Negociações sobre Telecomunicações Básicas também foi juntado ao GATS, estendendo o prazo de preenchimento das Isenções do artigo II do GATS (referentes ao princípio da nação mais favorecida). Em 15 de fevereiro de 1997, os países participantes do GTB concluem um acordo específico. Ele ganha a forma de um protocolo anexo ao GATS, e passa a ser oficialmente designado como o Quarto Protocolo do GATS (Fourth Protocol to the GATS), principal fonte de introdução dos compromissos específicos para cada Estado-membro. Sob os auspícios desse Protocolo, estabeleceram-se diversas agendas de liberalização, assumidas por países desenvolvidos e em desenvolvimento. No final, cinqüenta e cinco agendas de compromissos foram feitas envolvendo sessenta e nove países-membros (com a Europa sob uma única agenda), levando finalmente à formalização do Quarto Protocolo.
Uma ruptura importante do Quarto Protocolo foi a adoção do “quase legendário” Reference Paper (ele recebeu este nome pois suas regras foram integradas no GATS) como um comprometimento adicional incorporado nos cronogramas dos Países Membros. Ele é sem dúvida, um instrumento especial dentro da estrutura jurídica da OMC e de particular importância para o regime mundial de telecomunicações.
[12] Algumas das novas propostas de negociações sugerem que o Reference Paper se aplicaria a todos os serviços de telecomunicações. Ver “The WTO Regime for Telecommunications Services”, Marco C. E. J. Bronckers and Pierre Larouche em WTO Jurisprudence and Policy: Practitioners’ Perspectives, Marco C.E.J. Bronckers and Gary N. Horlick (eds.), London: Cameron May, 2004, páginas 519-590, na página 553 e sequência. Ver também Communication from Colombia, Telecommunications Services, S/CSS/W/119, 27 November 2001.
[13] Sobre o Annex on Telecommunications:
Ver texto abaixo sobre o Anexo sobre Telecomunicações na referência: Telecomunicações: Condições do Brasil em Doha, Yi Shin Tang, Página 107, da publicação Comércio de serviços na OMC, Umberto Celli Junior (Coord.), Curitiba, Juruá, 2005.
Ante todas as considerações feitas até agora, vale lembrar que o GATS é um acordo-quadro que regula vários serviços simultaneamente, muitas vezes interrelacionados ou mesmo interdependentes. Assim sendo, é imprescindível que os compromissos assumidos em um setor não possam ser obstados pela falta de progresso em outro. Isso se torna manifesto no caso das telecomunicações, visto que elas são ferramenta essencial para o pleno funcionamento de algumas atividades, como as transações financeiras e comércio eletrônico.
Tal situação justifica a elaboração do Anexo sobre Telecomunicações (Annex on Telecommunications), cuja função precípua é garantir às outras atividades econômicas o acesso e uso do serviço público de telecomunicações do país compromissário, “em termos e condições razoáveis e não discriminatórios” e dentro de uma transparência técnica, tarifária e reguladora. O Anexo não tem por escopo a obrigação de acesso a mercado nem a de tratamento nacional, mas exclusivamente garantir que a rede de telecomunicações não limite o desenvolvimento de outras atividades. Por isso, os §§ 2º e 5º, “g”, do Anexo permitem aos países em desenvolvimento argüirem suspensão das obrigações de uso e acesso, a fim de fortalecerem seus mercados nacionais.
[14] Ver Green Paper on the convergence of the telecommunications, media and information technology sectors, and the implications for regulation: Towards an Information Society approach, European Comission, COM (1997) 623, 3 December 1997; Ver “Towards a new framework for electronic communications infrastructure and associated services: the 1999 Communications Review”, COM(1999) 539 final, 10 November 1999 (Regulatory framework for electronic communications, European Comission e A First Assessment of the New European Regulatory Framework for Electronic Communications, Alexandre de Streel, Faculty of Economics, University of Namur); Ver “Convergence between Telecommunications and Other Media” (1998) Telecommunications Policy, Colin R. Blackman, Vol. 22, No 3, páginas 163-170; Ver New Ways to Think about the Visions Called ‘Convergence’: A Guide for Business and Public Policy, P.H. Longstaff, Program on Information Resources Policy, Harvard University, April 2000; Ver The Implications of Convergence for Regulation of Electronic Communications, OECD, DSTI/ICCP/TISP(2003)5/final, 12 July 2004; Ver “The WTO and Global Convergence in Telecommunications and Audio-Visual Services” Damien Geradin and David Luff (eds.), Cambridge: Cambridge University Press, 2004, especialmente em Milton L. Mueller, “Convergence: A Reality Check”, páginas 311-322 e Pierre Larouche, “Dealing with Convergence at the International Level”, páginas 390-422.
[15] Television without Frontiers: A Diretiva Council Directive 89/552/EEC of 3 October 1989 de 17.out.1989 na solução de certas cláusulas que foram canceladas pela lei, regulação ou ação administrativa dos Países Membros em relação ao prosseguimento das atividades de radiodifusão de televisão, quando aditivada pela Directive 97/36/EC, de 30.jul.1997.
[16] Veja a Proposta para uma Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho aditivando a Diretiva 89/552/EEC de 1989 na solução de certas cláusulas canceladas pela lei, regulação ou ação administrativa dos Países Membros no prosseguimento das atividades de radiodifusão de televisão (COM (2005) 646 final, 13 December 2005).
[17] De fato, poucos Países Membros da Comunidade Européia têm feito comprometimentos com os Serviços Audiovisuais e de forma variável. Para um resumo destes compromissos ver “Preparing Negotiations in Services: EC Audiovisuals in the Doha Round”, Patrick A. Messerlin/Emmanuel Cocq em The Audiovisual Services Sector in the GATS Negotiations, Patrick A. Messerlin/Stephen E. Siwek/Emmanuel Cocq Washington, DC: American Enterprise Institute Press, 2004, Tabela 7, Página 33; Ver MARTIN ROY, “Audiovisual Services in the Doha Round: Dialogue de Sourds, The Sequel?”, Martin Roy, The Journal of World Investment and Trade, 2005; Ver “The WTO, The Internet and Trade in Digital Products”, Sacha Wunsch-Vincent, Oxford/Portland, Oregon: Hart Publishing, 2006, na página 73 (Book Review).
[18] As isenções MFN atualmente agendadas são:
(i) obrigações reparatórias contra práticas de preços não justas por distribuidores de trabalhos audiovisuais (aplicadas a todos os Membros da OMC);
(ii) contra-medidas contra condições ou ações adversas, não justas ou não razoáveis tomadas por outros Membros (aplicadas a todos os Membros da OMC);
(iii) extensão de tratamento nacional para os trabalhos de audiovisuais que satisfazem a certos critérios linguísticos e de origem em relação a radiodifusão (aplicada aos países europeus);
(iv) extensão de tratamento nacional para trabalhos audiovisuais cobertos por acordos de co-produção (aplicados a todos os países com os quais um acordo pode ser concluído);
(v) garantia de benefícios de programas como Media e Eurimages que satisfaçam ao critério de origem europeu (aplicada a todos os países europeus); e três isenções MFN para medidas aplicadas a Países Membros específicos (Espanha, Itália e Países Nórdicos); ver também WTO, European Communities and Their Member States: Final List of Article II (MFN) Exemptions, GATS/EL/31, 15 April 1994 (Referências do Google).
[19] Ver Communication from the European Communities and its Member States, Conditional Initial Offer, TN/S/O/EEC, 10 June 2003, PÁGINAS 80-84; Ver Communication from the European Communities and its Member States, Conditional Revised Offer, TN/S/O/EEC/Rev.1, 29 June 2005, em particular nas páginas 187-214 e Attachment C; ver também Council Resolution of 21 January 2002 on the development of the audiovisual services sector, OJ C 32/4, 5 February 2002, cláusula 5 na qual se lê: “during the forthcoming WTO negotiations the Union will ensure, as in the Uruguay Round, that the Community and its Member States maintain the possibility to preserve and develop their capacity to define and implement their cultural and audiovisual policies for the purpose of preserving their cultural diversity”.
[20] Sobre sanções a Países Membros do GATS na opinião de Dra Gisele Leite (Professora Universitária, Mestre em Direito, Mestre em Filosofia, Doutora em Direito):
A responsabilidade internacional possui contornos peculiares distintos da responsabilidade de direito interno. Nesse caso a responsabilidade é o Estado endossante ou ratificador do tratado ou convenção internacional que é instituto consuetudinário e tem explícita natureza política.
Tanto a doutrina como jurisprudências identificam os elementos identificadores da responsabilidade internacional: o ato ilícito, a imputabilidade e o prejuízo ou dano.
No caso em tela temos a imputabilidade que labora nexo que lega a conduta ao responsável perante a ordem internacional, assim, os funcionários que representam o referido Estado. O dano que é elemento essencial da responsabilização, não será necessariamente material, nem terá expressão econômica.
Há danos imateriais, suscetíveis de reparação como por exemplo, a condenação de um país e seu desenvolvimento ao atraso marginal em razão da tecnologia mundial e da negativa a obtenção do chamado desenvolvimento sustentável.
A violação de norma internacional que também inclui o costume internacional poderá acarretar sanções como bloqueio ou boicote econômico, cultural e até política dentro das organizações ligadas a ONU, OEA e, etc...A ruptura de relações diplomáticas e amistosas com os órgãos diretores do organismo internacional.
Lembremos que os princípios básicos do GATT é o multilateralismo, comércio livre e leal. Portanto, o protecionismo é contrário a esse princípio de liberalismo do comércio. Portanto, se as práticas dos setores públicos e mesmo privados não sejam consideradas legais, usam-se medidas anti-dumping, compensatórias, bem como o mecanismo de solução de disputas sob o sistema do GATT. Na prática, há pouca efetividade pela falta de órgão controlador do GATT e de sanções mais drásticas devido ter que se respeitar a autonomia e soberania dos países-membros.
Veja o site Diálogos Jurídicos da Professora Gisele.
Eduardo Prado é Publisher da Revista de WiMAX.
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