26/05/08
Em Debate Especial: P.G.O.
Correção das Prioridades?
Guilherme Ieno Costa
Diretor da ABDI
O anúncio da proposição de um Plano Geral de Revisão do Modelo Regulatório de Telecomunicações no país, para acompanhar o que seria o simples casuísmo da mudança no Plano Geral de Outorgas para permitir a união de concessionárias do STFC, conforme destacado em artigo que recentemente publiquei, demonstra que, enfim, há um reconhecimento oficial de que o setor carece sim de mudanças significativas.
Não que a alteração do PGO, para viabilizar a reunião de duas ou mais concessionárias do STFC, não mereça a reflexão e avaliação da nossa sociedade. Muito pelo contrário. Percebeu a Anatel, em tempo e acertadamente, que não se pode iniciar o jantar pelo “cafezinho”, com o anúncio do referido PGR para acompanhar as eventuais mudanças a serem implementadas no Plano Geral de Outorgas.
No que concerne especificadamente ao PGO, vale lembrar que a opção escolhida pelo Governo Federal, quando da desestatização do Sistema Telebrás, foi em prol da regionalização do país (e não da sua desestatização em um único bloco) e se justificou pelos seguintes motivos: (i) o porte de três a quatro empresas seria compatível com as necessidades de geração própria de recursos e com as metas de investimento no setor, ou seja, seriam empresas de grande porte, sendo este desejável em razão dos pesados investimentos a serem realizados; (ii) a regionalização possibilitaria a focalização de investimentos por regiões do país; (iii) seria facilitado o trabalho do órgão regulador, na medida em que, havendo várias companhias, o risco de monopólio seria reduzido e, estimava-se, o ambiente seria de competição comparativa; (iv) a regionalização também permitiria a criação de incentivos às metas de investimento e obrigações de serviço universal.
Além disso, admitia-se que a criação de empresas regionais deveria levar a empresas fortes, capazes de focalizar seus investimentos dentro de suas respectivas regiões. Essas empresas deveriam dispor de fluxo de caixa adequado, grande potencial de crescimento e oportunidade de atingir bons níveis de receita por acesso. Ademais, a regionalização consideraria a contigüidade geográfica e a topologia da rede anterior, de modo a reduzir eventuais dificuldades de natureza político administrativo e técnica. Um aspecto importante, nas considerações do Governo Federal, era o da homogeneidade da região, que facilitaria tanto a operação da empresa como a tarefa do órgão regulador, que não precisaria adotar regras diferenciadas para uma mesma empresa, em função das variações no mercado que ela atende.
A opção pela regionalização, por outro lado, teve também uma importância estratégica no processo de privatização do Sistema Telebrás, na medida em que era fundamental à proposta de reforma criar condições atrativas para investidores, especialmente estrangeiros, garantindo a escala de operação das empresas a serem vendidas.
Já, as pressões atuais pela revisão do modelo baseiam-se no argumento de que, para ganhar fôlego e crescer, é preciso ter escala nacional, com objetivos de (i) enfrentar grupos internacionais que atuam em bloco na América Latina, (ii) concorrer no mercado internacional de telecomunicações, (iii) redução de custos operacionais, entre outros aspectos econômicos que normalmente acompanham as justificativas de qualquer movimento de concentração em determinado mercado relevante.
Até o momento, não se sabe exatamente o que e quais temas serão tratados no chamado PGR. Tem-se a expectativa, entretanto, de que o mesmo venha “desengavetar” muitos dos estudos já realizados por consultorias contratadas pela Agência, minutas de regulamentos já discutidos internamente e pré-finalizados, bem como propor a discussão de outros assuntos afetos à introdução de mecanismos competitivos no setor.
A ordem inicial de julgamento das duas matérias pelo Conselho Diretor, não fossem os sucessivos pedidos de vista, demonstra, inclusive, que o julgamento do plano geral de revisão precederia a mudança do Plano Geral de Outorgas. O timing dessa precedência, em que pese seja extremamente exíguo - ou seja, regras de fomento à competição serão introduzidas, em tese, simultaneamente (e não com uma ampla e razoável antecipação) à revisão das regras de concentração no mercado das concessionárias do STFC - já consola o setor, o qual preocupa-se com os potenciais efeitos nocivos que um operador nacional de rede e os benefícios econômicos que essa escala lhe garantirão.
O que se espera é que as medidas a serem divulgadas não sejam uma simples repetição das antigas pautas anuais da Agência, e que as mesmas sejam efetivamente implementadas. Causa-me particular estranheza o fato alguns agentes interpretarem como esforço para fomento da competição a introdução focada de mecanismos para que uma concessionária possa investir/competir na região da outra e simplesmente deixarem de lado (como estão há tempo) outras ferramentas cruciais (e.g. revenda, unbundling, separação estrutural), pois, como sabemos, a competição pode e deve ser muito mais ampla que entre duas ou três empresas.
Além disso, a eficiência no julgamento das demandas administrativas e na execução de suas decisões é outro ponto que merece destaque, na medida em que não basta a simples edição de regulamentos para se assegurar o cumprimento de direitos e deveres, sem que, por outro lado haja garantia coercitiva do seu cumprimento.
Portanto, é justamente em razão de tais aspectos (não introdução prévia de regras competitivas e deficiência na adoção de medidas coercitivas) que o modelo de concentração adotado em outros países (muito melhor instrumentalizados nesses aspectos), que permitiu a reunião dos antigos players em novos blocos econômicos, infelizmente não serve como uma luva para a mudança que se pretende no país. A distância do “grau de compliance regulatória” nos EUA e vários países Europeus ainda é muito grande em comparação a nossa. Demos um passo grande nesse sentido com a introdução da LGT, criação da Anatel, mas a pergunta é se, com uma apressada alteração no PGO, teremos condição, via fiscalização e adoção de medidas regulatórias “ex post”, quer seja por parte da Anatel ou por parte do SBDC (CADE e SDE), de garantir que eventuais práticas anti-competitivas não venham excluir e ou afastar investimentos em inovação no setor.
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