04/05/2020

Em Debate

 

 

 

5G e Competição

 

João Moura

Presidente-Executivo da TelComp

 

Ao longo de mais de um ano a TelComp realizou vários encontros com suas associadas e especialistas em tecnologia e regulamentação, para discutir a tecnologia 5G e, em especial, as alternativas estratégicas para as operadoras competitivas.

 

O potencial de transformação que a tecnologia 5G trará para as telecomunicações é significativo e nenhuma operadora pode ficar fora do debate. A conectividade móvel, o universo de fibra óptica, o mercado de IoT, as plataformas e a distribuição de conteúdo, serão bem impactados. Isto abre oportunidades, mas exige rigorosa avaliação estratégica, pois as alternativas não são simples.

 

Um dos aspectos críticos foi o debate sobre os blocos regionais. Os grandes grupos certamente não apoiam a ideia pois isto abre um flanco para novos competidores. Para as operadoras competitivas os business cases são desafiadores: Lançar 5G sem contar com o 4G, os compromissos de cobertura, a desvantagem competitiva em relação aos detentores de infraestrutura e as etapas ainda em desenvolvimento do ponto de vista tecnológico, deixam muitas variáveis em aberto para tomada de decisão.

 

Entretanto, o posicionamento da TelComp foi no sentido de que o Edital não poderia eliminar de antemão as possibilidades de participação de novas operadoras e ai a regionalização é importante. Felizmente o Conselho da  Anatel, depois de longos debates, incluiu a regionalização na proposta de Edital. 

 

Considerando todo o potencial de inovação da nova tecnologia, é certo que muitos modelos de negócios sequer foram criados ou pensados ainda. Porém precisarão de acesso ao espectro de 5G para deslancharem.  Daí a enfase  que colocamos em nossas contribuições, para alternativas de acesso ao espectro de forma regulada, transparente e previamente definida no Edital.

 

O ponto central é que o espectro para 5G, que é o insumo essencial para o futuro, não pode ficar sob o controle absoluto das operadoras históricas. Assegurar alternativas para as operadoras competitivas é crucial.

 

Texto da Contribuição da TelComp

 

A TelComp cumprimenta a Anatel pela realização da presente Consulta Pública e por todo o trabalho empreendido na elaboração dessa minuta de Edital de Licitação de espectro para a implementação da tecnologia 5G, que será um marco para o desenvolvimento das telecomunicações e que impulsionará a transformação digital no país.

 

A realização do Leilão poderá ser um marco importante para a agenda positiva de retomada da economia após a grave crise que o mundo enfrenta hoje. O Leilão bem estruturado e que não priorize arrecadação, mas o investimento, será uma alavanca importante para a estímulo das atividades econômicas no Brasil, num momento tão importante. Portanto, competência e celeridade da Anatel na condução deste complexo projeto serão mais uma grande contribuição que prestará ao país.

 

A TelComp já apresentou contribuições sobre o tema noutras oportunidades, sempre reconhecendo que a tecnologia 5G trará mudanças significativas nas telecomunicações no Brasil, não só para os serviços móveis, mas para a criação de inúmeros novos modelos de negócios, num ecossistema digital, com múltiplos agentes, cada qual aportando contribuições especificas, que viabilizarão transformações profundas no funcionamento de vários setores das atividades econômicas e da sociedade, de forma geral.

 

A implantação da tecnologia 5G, demandará maior e melhor infraestrutura, de redes de fibra óptica, para atender requisitos para novas aplicações e, para tal, é importante a atualização dos marcos regulatórios visando estímulo ao compartilhamento de elementos ativos e passivos entre os prestadores, incluindo postes, torres, dutos e condutos, antenas, acesso a leitos de rodovias, ferrovias, imóveis públicos e mesmo ao espectro, para racionalizar investimentos e acelerar a execução de projetos. Esse é um tema essencial e há tempo demanda soluções no âmbito legislativo e regulamentar.

 

A chegada da tecnologia 5G é a oportunidade para o avanço rápido na solução definitiva dessas questões e assim remover as barreias enfrentadas para os investimentos. Tais preocupações motivaram ações, como algumas sugeridas aqui, nos Estados Unidos e na União Europeia, por exemplo, onde os órgãos reguladores das telecomunicações se colocaram à frente da coordenação de esforços junto às demais esferas de governo, de forma que os investimentos avancem com celeridade, segurança jurídica e economicidade.

 

O desenvolvimento da Internet das Coisas - IoT ganhará novo impulso com a tecnologia 5G e exigirá a atualização de marcos regulatórios específicos, para suas múltiplas e novas aplicações, bem como a substancial desoneração tributária, hoje ainda arraigada nos modelos obsoletos que prevalecem nas telecomunicações, inclusive as pesadas contribuições a fundos setoriais, totalmente incompatíveis com a nova realidade. Em seu papel de fomento ao desenvolvimento das telecomunicações, a Anatel tem papel legítimo e importante na interlocução com outras esferas de poder, para influenciar políticas públicas e legislações necessárias para viabilizar a expansão de IoT.

 

Para fomento à competição será necessário o aperfeiçoamento da regulamentação da Anatel específica sobre uso secundário do espectro, sobre modelos de "MVNO", a criação de regulamento sobre o novo mercado secundário de espectro, entre outras providências. Esses aspectos são importantes para criar alternativas de acesso ao espectro por operadoras especializadas, com a devida segurança para investimentos e, ao mesmo tempo, oferecer previsibilidade e preservar direitos das prestadoras que adquirirem autorizações de uso no Leilão.

 

O novo mercado secundário não pode ter caráter especulativo, mas vai possibilitar novas formas de uso compartilhado de frequências, que são recursos escassos e essenciais para o novo contexto das telecomunicações.

 

Considerações específicas:

 

A minuta de Edital proposta pela Anatel já é muito boa, mas apresentaremos aqui contribuições específicas para alguns aprimoramentos. Sabemos que a Anatel prefere receber propostas de alteração diretamente no texto sob consulta pública, mas por vezes as contribuições não se encaixam claramente em cada item da Minuta de Edital por exigir alterações em mais de um ponto. Ainda assim faremos inserções no texto, mas rogamos que a Equipe da Anatel atente para o texto corrido aqui apresentado, para assim poder apreciar as contribuições de forma mais consistente.

 

Leilão não arrecadatório e assimetrias para operadoras sem "poder de mercado significativo", as PPP

 

O Leilão não deve ter caráter arrecadatório. Este critério é especialmente importante neste momento de grave crise econômica e escassez de recursos, que devem ser priorizados para que os investimentos fluam rapidamente, para permitir cumprir compromissos de cobertura e acelerar o lançamento dos novos serviços.

 

O caráter não arrecadatório também é importante para viabilizar a participação de novas entrantes e das PPPs, que já enfrentam severas "barreiras de entrada" e precisam de regras que priorizem os investimentos, cujos compromisso já serão desafiadores, nos termos da presente Minuta de Edital.

 

Divisão Regional dos lotes e sequenciamento de etapas do Leilão

 

Para a faixa de 3,5 GHz, os blocos regionais deveriam ter pelo menos 80 MHz para um maior aproveitamento do potencial da tecnologia 5G. A regionalização da faixa de 3,5 GHz, como proposta, resulta em áreas ainda muito grandes e diversas, o que dificulta ou impede a participação de operadores com interesses regionais. No modelo proposto, com áreas muito grandes, corre-se mais risco de afastar interessados, ou levar ao descumprimento dos compromissos no futuro. Reconhecendo que não é desejável grande fragmentação pelos problemas técnicos que causariam, a regionalização poderia ser feita por CN - Código Nacional, ou no máximo por estado da federação. Tal modelo, com regiões menores, atrairia um maior número de interessados facilitando planos de negócios, o atendimento de compromissos de cobertura e aproveitamento de sinergias em áreas onde já são prestados outros serviços.

 

A faixa dos 700 MHz também deveria segmentada por regiões, nos mesmo moldes da faixa de 3,5GHz, devendo ser licitada logo depois da faixa de 3,5 GHz, para criar a possiblidade de combinação das duas faixas, o que amplia possiblidades de negócios.

 

Na faixa de 700 MHz, deve prevalecer a mesma lógica, com pagamento de 10% e 90% em compromissos, outra vez, seguindo a mesma regionalização da faixa de 3,5 GHz.

 

Obrigatoriedade de uso para 5G

 

O Edital deve estabelecer a obrigatoriedade de disponibilização de serviços utilizando tecnologia 5G. A introdução da nova tecnologia vai criar ambiente propício para o desenvolvimento e, portanto, deve ser priorizada.

 

Alternativas para acesso ao espectro e precificação

 

A tecnologia 5G propiciará o desenvolvimento de muitas aplicações e a criação de novas empresas, atração de novos investidores e a formulação de modelos de negócios sequer imaginados neste momento. Por esta razão é importante que a Anatel crie alternativas para uso futuro do espectro que vá além da aquisição direta no Leilão.

 

Por outro lado, não se pode deixar ociosos recursos escassos esperando usos futuros. Dessa forma, é importante que se considere (1) o aperfeiçoamento do regulamento de uso secundário; (2) a alteração do regulamento de MVNO para criar obrigações de oferta e regras claras de precificação; (3) a estruturação do mercado secundário de forma flexível e não especulativo; (4) os acordos de compartilhamento de redes do tipo RAN Sharing devem ser integralmente divulgados e, com previsão para que sejam oferecidos arranjos similares a terceiros, em condições equivalentes; (5) a definição de regras especificas para acesso ao espectro para aplicações de IoT e possibilidades de compartilhamento, utilizando tecnologias como slicing, entre outras, quando disponíveis; e (6) a possiblidade de licenças especiais de uso para aplicações especificas tais como redes privadas e usos nas indústrias.

 

Aplicação da Lei Geral de Antenas

 

A tecnologia 5G demandará investimento significativo na instalação de infraestrutura, gerando maior necessidade de antenas e de redes de fibra óptica. As legislações restritivas na maioria dos municípios brasileiros e a morosidade dos processos de licenciamento não são favoráveis para permitir execução rápida e eficiente de projetos.

 

Para que o uso das respectivas radiofrequências aconteça de forma rápida, é importante a real aplicação prática da Lei Geral de Antenas e a regularização do uso compartilhado dos postes para permitir a densificação necessária para suporte a 5G. A adesão dos municípios à Lei Geral de Antenas é essencial para a criação de ambiente favorável e célere. A atuação da Anatel, coordenada com o MCTIC e o Ministério das Cidades é crucial para resolver estes entraves que há anos prejudicam o desenvolvimento das telecomunicações no Brasil.

 

Indenização dos valores de ressarcimento das operadoras de satélites

 

Os valores devidos para as operadoras de satélites para a desocupação de faixas deverão constar de forma explícita no Edital de Licitação, bem como deve ser inserida a previsão de desconto do preço mínimo estabelecido, visando segurança jurídica para todos os envolvidos no certame.

 

Segurança de redes

 

Por fim, vale destacar a questão de segurança, que vai se tornando cada vez mais difícil à medida que cresce a economia baseada em dados. Isso impacta o volume de dados trafegados nas redes e armazenados nos mais diversos dispositivos. Tudo isso cresce expressivamente nas redes de altíssima velocidade, como as com a tecnologia 5G.

 

Na economia digital, o acesso e a manipulação de dados é fonte de geração de valor e isso atrai cada vez mais o interesse dos mais diversos agentes, com os mais variados propósitos. A proteção de dados e segurança cibernética é um negócio de grande envergadura globalmente e sabe-se que bilhões são investidos por empresas e governos para criar, e para violar, sistemas de segurança cibernética.

 

Nesse sentido, é no contexto do lançamento da tecnologia 5G que as políticas de regulamentação sobre segurança devam ser objeto de reavaliação e aperfeiçoamento onde couber.

 

Conclusão

 

A TelComp espera que as presentes contribuições sejam úteis para aprimorar o Edital de Licitação proposto, e que permita o desenvolvimento e o fomento à inovação nas telecomunicações num regime de competição justa e isonômica.

 

 

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