03/03/08
Em Debate Especial: Projeto de Lei nº 29
O complicado e importante ato
de regulamentar as Comunicações em benefício da sociedade.
Mario Cesar Pereira de Araújo
Presidente da TIM
(Tele)Comunicações sempre foi objeto de preocupação das políticas governamentais, no Brasil e no exterior, sempre com o objetivo de tornar-se uma alavanca para o desenvolvimento.
Sentindo o distanciamento da vanguarda tecnológica, o então presidente francês Giscard d’Estaing, na década de 70, solicitou ao economista Simon Nora que apresentasse uma proposta de planejamento para viabilizar um salto tecnológico no país. Seu trabalho, depois de publicado, teve o sugestivo título de “A Informatização da Sociedade”.
No Brasil, durante a gestão de Fernando Henrique Cardoso, com a incapacidade do Governo de investir na expansão e modernidade das Telecomunicações, decidiu-se privatizar o setor, de forma a atrair investimentos de empresários nacionais e internacionais ao país. O modelo escolhido, de divisões regionais, teve como um dos objetivos maximizar os valores a serem pagos ao Governo, permitir a competição e beneficiar a sociedade.
Dez anos se passaram e vemos uma revolução no desenvolvimento tecnológico e na oferta de produtos e serviços inovadores para a sociedade, derivados dessa evolução tecnológica.
A sociedade brasileira não pode deixar de acompanhar essa evolução por causa de leis e regulamentos que não acompanham a modernidade. Isso significaria para o país um atraso no processo de inclusão digital e um reforço nas diferenças sociais. Compete ao Governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao Congresso Nacional e à Anatel criar mecanismos que viabilizem essa impreterível necessidade da sociedade.
A vontade política do Governo Federal em contar com uma empresa de capital brasileiro deve ser respeitada, até porque não é uma decisão isolada, pois observamos grandes nações com a mesma política. Entretanto, não devem ser esquecidos nesse processo a garantia da competição, do respeito aos aportes de capital já realizados por investidores nacionais e estrangeiros, seja pelos sócios majoritários ou pelos pequenos investidores por meio das bolsas de valores.
Deve-se atentar para o benefício tecnológico da inclusão social para a sociedade brasileira, que não deve ser esquecido, e a possibilidade de que todo o empenho, inclusive com recursos da sociedade, no futuro, seja transformado em vultosos lucros, não pela prestação de serviço e sim pela venda de ativos.
A iniciativa do Ministro das Comunicações Hélio Costa foi importante ao lançar, em consulta pública, a discussão que tanto a política quanto a sociedade, necessitam. Ouvir todos os segmentos da sociedade, suas necessidades e sugestões, demonstra claramente a importância política e a forma democrática com que o Ministro vem abordando o assunto.
Observamos também uma maior agilidade da Anatel nas decisões que podem acelerar as políticas de Telecomunicações. As decisões já se materializaram com a bem-sucedida licitação das licenças de Terceira Geração com pesados compromissos de universalização; negociações para alteração de obrigações contratuais das concessionárias fixas para outras mais adequadas para a sociedade; a implantação da estrutura de custos para as definições de tarifas de interconexão; a portabilidade; e as novas regras do Serviço Móvel Pessoal, com o objetivo de melhorar a qualidade de atendimento aos clientes, entre outras.
Estas alterações devem vir acompanhadas por uma análise econômica, garantindo a saúde financeira das operadoras e de forma a não desacelerar novos investimentos no setor.
O retorno para os acionistas do setor de telecom, hoje, é menor do que se os mesmos investimentos tivessem sido realizados em outros setores produtivos. Certamente, essa situação se constitui em um fator crítico para o crescimento e modernização das telecomunicações.
Não menos importante é a discussão que está sendo realizada na Comissão de Ciência e Tecnologia, sobre o Projeto de Lei 29 (PL29), que deverá definir as regras de conteúdo - sua criação, formatação e distribuição.
Mais do que uma queda de braço entre os setores interessados, devemos evidenciar os benefícios que poderão ser entregues à sociedade com o acesso aos conteúdos (informações, entretenimento etc.), em multiformatos e multiterminais e em um número maior de empresas distribuidoras. Com isso se formará um círculo virtuoso: o aumento de usuários possibilitará o crescimento de empresas distribuidoras, que por sua vez deverá gerar a criação de novas empresas de conteúdo. Na cadeia final, teremos um maior número de clientes e maior competição, que trarão redução de preços dos produtos e equipamentos terminais.
Para isso, algumas premissas devem ser consideradas nessa legislação. O Brasil, país de dimensões continentais, mesmo com a unidade da língua portuguesa, possui uma riquíssima diversidade cultural, orgulho dos cidadãos de cada uma de nossas regiões. Em hipótese alguma, em nome da globalização, podemos perder os valores regionais, o que somente será evitado incentivando-se a criação e a distribuição de conteúdos regionais.
Não podemos destruir a competência e saúde financeira das emissoras de canais abertos, suas programações de informação, cultura e de entretenimento que representam um serviço de utilidade pública e de redução da distância cultural das diversas camadas da população, que têm acesso a esses conteúdos de forma gratuita. Muitas dessas programações são exportadas, propiciando uma valiosa divulgação de nossa cultura, de nossas belezas naturais e de nossa competência. Sem duvida alguma, é um motivo de orgulho do qual não podemos prescindir.
Outros atores nesse processo são as operadoras de serviços de telecomunicações que, com a capilaridade de suas redes (físicas ou bandas de freqüência), constituem-se em componente essencial na massificação e no sucesso desse processo.
A recente licitação realizada pela Anatel, que possibilitará a oferta de serviços mais avançados e em banda da larga, certamente em muito contribuirá para essa massificação, principalmente pela exigência dos compromissos de universalização, cobrindo todos os municípios do País. É indispensável que os resultados do PL 29 levem também em consideração esse potencial.
Compete aos nossos legisladores abrir mão de conceitos pré-concebidos e elaborar uma lei que não mutile o acesso da nossa sociedade às novas tecnologias disponibilizadas, que já são de posse das populações de outros países, preservando e incentivando produções regionais e nacionais, em diversos formatos, e incentivando a competição na distribuição.
Não poderia deixar de mencionar a necessidade de se fazer uma reforma tributária que, sem nenhuma dúvida, irá contribuir para a universalização. É errôneo pensar que, em um mercado elástico, uma redução de impostos resultará em redução da arrecadação. Essa indústria ainda possui um grande potencial de crescimento. Assim, menores preços permitirão maior número de usuários com maior número de utilização e, em conseqüência, maior arrecadação de impostos.
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