Em Debate

 

 

“Terceirização no setor de telecomunicações”

 

 

Juarez Quadros do Nascimento

Sócio da Orion Consultores Associados e ex-ministro das Comunicações

 

A terceirização nos serviços de telecomunicações no Brasil é um dos temas em evidência que aliado às interrupções, atendimento insatisfatório e falta de competição em alguns segmentos, como na telefonia fixa e banda larga, expõe o setor a riscos.

 

A propósito, em maio/09, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) julgou ilegal a contratação de terceiros para atividade fim em “uma concessionária” do setor elétrico. No mesmo mês, sem analisar o mérito da terceirização, o TST decidiu se ater ao julgamento do processo que envolve “uma operadora” de telecomunicações e o MPF/RN.

 

Em julho último, o TRT/MG manteve sentença contra “outra operadora”, considerando que o art 94, II, da Lei Geral de Telecomunicações (LGT) não se estende ao Direito do Trabalho, pois a Súmula 331, do TST, tem por ilegal a contratação de terceirizados para atividade fim.

 

O entendimento é que o termo “inerente” (da LGT) pode ser interpretado como “atividade fim”. As decisões da Justiça do Trabalho abrem ampla discussão para o setor de telecomunicações, embora os Sindicatos e o Partido dos Trabalhadores, superatuantes no passado estatal, hoje se distanciem dos fatos.

 

No presente, ocorrem interrupções na prestação dos serviços explorados em regime público (telefonia fixa) e privado (celular e banda larga). Falha recente de “uma operadora” em São Paulo teria sido causada por terceirizado. Por oportuno, abordo a “terceirização” emprestando considerações de Kotler e Caslione, e depois contextualizo a LGT no que se refere a contratar com terceiros, direito dos usuários e fiscalização dos serviços.

 

No Livro “Vencer no caos” – Philip Kotler e John Caslione (Campus/Elsevier, 2009) – que trata de minimizar vulnerabilidades e explorar oportunidades, os autores citam no Prefácio que “A terceirização sempre teve defensores e detratores”. Não pretendo aqui defender, nem detratar a terceirização, mas alertar operadores e reguladores sobre dependência, riscos e responsabilidades, quando no setor de telecomunicações.

 

No “Desenvolvimento de sistemas gerenciais para a resiliência” (Livro, Cap 4), Kotler e Caslione expõem, na forma de checklist, diversos ajustes para as diferentes áreas de uma organização, como “cortar/postergar”, “terceirizar” e “aumentar/acelerar”. A seguir, destaco alguns dos ajustes sobre “terceirizar” (com grifos meus) deixando de focar os demais.

 

- Checklist de comportamentos estratégicos de ajuste ao caos para as áreas de finanças e tecnologia da informação (Livro, Fig 4.4 – pg 114):

 

Terceirizar:  - Todas as atividades de apoio não essenciais, ou o máximo possível.

 

- Todas as atividades de TI, ou o máximo possível.

- Todas as atividades de RH, ou o máximo possível.

 

- Idem, porém para as áreas de fabricação e operações (Livro, Fig 4.5 – pg 123):

 

Terceirizar:  - Trabalhos de projetos e engenharia que não são fundamentais para a vantagem competitiva.

 

- Produção que exige nova tecnologia ou novos equipamentos.

- Produção de baixo valor.

- Logística e gestão da cadeia de suprimentos.

 

- Idem, porém para as áreas de compras e abastecimento (Livro, Fig 4.6 – pg 129):

 

Terceirizar:  - Trabalhos de projetos e engenharia que não são fundamentais para a vantagem competitiva.

 

- Produção que exige nova tecnologia ou novos equipamentos.

 

- Idem, porém para a área de vendas (Livro, Fig 5.2 – pg 164):

 

Terceirizar:  - Vendas a pequenos clientes não essenciais.

 

- Busca de fontes de recomendações.

- Serviços a clientes não essenciais.

- Visitas técnicas.

- Serviços sob garantia.

- Atividades de desenvolvimento de negócios não essenciais.

 

Do que se observa, ainda que não tratem especificamente do setor de telecomunicações, os autores avaliam comportamentos estratégicos de ajuste ao caos, com a terceirização de atividades em diversas áreas, mas sempre excluem aquelas consideradas essenciais, ou que são fundamentais para a vantagem competitiva.

 

Abordando o setor de telecomunicações, a rigor e sem surpresas, a terceirização me causa curiosidade dada a falta de proximidade entre as ações correntes de operadoras, com as avaliações de Kotler e Caslione e as disposições a seguir (com grifos meus), contidas na LGT.

 

Contratar com terceiros – Os escopos institucionais estabelecidos pelo Legislativo no que se refere a contratar com terceiros, reunidos na LGT, Livro III (da Organização dos Serviços de Telecomunicações), Título II (dos Serviços Prestados em Regime Público), Capítulo II (da Concessão), Seção II (do Contrato), dentre outros, dispõem que:

 

- No cumprimento de seus deveres, a concessionária poderá, observadas as condições e limites estabelecidos pela Agência (LGT, art 94):

 

- contratar com terceiros o desenvolvimento de atividades inerentes, acessórias ou complementares ao serviço, bem como a implementação de projetos associados (LGT, art 94, II).

 

- Em qualquer caso, a concessionária continuará sempre responsável perante a Agência e os usuários (LGT, art 94, §1º).

 

Direitos dos usuários – Já os escopos institucionais estabelecidos pelo Legislativo no que se refere aos direitos dos usuários, reunidos na LGT, Livro I (dos Princípios Fundamentais), dentre outros, dispõem que:

 

- O usuário de serviços de telecomunicações tem direito (LGT, art 3º):

 

- de acesso aos serviços de telecomunicações, com padrões de qualidade e regularidade adequados à sua natureza, em qualquer ponto do território nacional (LGT, art 3º, I);

 

- à informação adequada sobre as condições de prestação dos serviços, suas tarifas e preços (LGT, art 3º, IV);

- ao prévio conhecimento das condições de suspensão do serviço (LGT, art 3º, VIII);

- de resposta às suas reclamações pela prestadora do serviço (LGT, art 3º, X);

- à reparação dos danos causados pela violação de seus direitos (LGT, art 3º, XII).

 

Fiscalização dos serviços – E os escopos institucionais estabelecidos pelo Legislativo no que se refere à fiscalização dos serviços, reunidos na LGT, Livro II (do Órgão Regulador e das Políticas Setoriais), Titulo II (das Competências), dentre outros, dispõem que:

 

- À Agência compete adotar as medidas necessárias para o atendimento do interesse público e para o desenvolvimento das telecomunicações brasileiras, atuando com independência, imparcialidade, legalidade, impessoalidade e publicidade, e especialmente (LGT, art 19):

 

- celebrar e gerenciar contratos de concessão e fiscalizar a prestação do serviço no regime público, aplicando sanções e realizando intervenções (LGT, art 19, VI);

 

- expedir e extinguir autorização para prestação de serviço no regime privado, fiscalizando e aplicando sanções (LGT, art 19, XI);

- reprimir infrações dos direitos dos usuários (LGT, art 19, XVIII).

 

Dependência – Pelo que se vê, lê e escuta, as empresas operadoras no país estão cada vez mais dependentes de fornecedores terceirizados no provimento de serviços necessários para o andamento dos negócios no setor de telecomunicações, ao demitirem executivos e profissionais especializados.

 

Riscos – À medida que as empresas aumentam a dependência de terceirizados ficam cada vez mais expostas a riscos operacionais, financeiros, trabalhistas e estratégicos. O uso, no limite máximo, do temerário expediente da terceirização dos serviços faz as empresas perderem a autonomia da decisão, ao perderem a competência em defini-la.

 

Responsabilidade – As empresas operadoras que utilizam serviços terceirizados precisam avaliar os fatores de risco e responsabilidade a que estão expostas. As empresas terceirizam as atividades, mas não terceirizam o risco e a responsabilidade. É a regra legal, ainda que a terceirização para atividade fim seja questionada na Justiça do Trabalho.

 

Pessoal próprio x terceirizado – A operação e manutenção de partes importantes dos sistemas de telecomunicações, quando nas mãos de pessoal próprio das operadoras, correm menos riscos, uma vez que a ação humana é exposta a falhas, mas se altamente especializada e supervisionada pode ser evitada, ou, contingenciada e controlada.

 

Crises – Em qualquer organização crises financeiras, crises de gestão ou resultados afetam Capex, Opex e a Margem de Lucros. Via de regra, na busca de dividendos, o que fazem os acionistas? Em detrimento dos usuários, empregados e fornecedores, obrigam os diretores a reduzir despesas de capital (cortam/postergam investimentos) e operacionais (demitem, terceirizam, reduzem margens dos terceirizados, etc).

 

Por fim, e não de forma diferente, atividades essenciais ou fundamentais para a desejada competição no setor de telecomunicações, com ou sem terceirização, adotando o esperado modelo de custos (inclusive os de capital), devem ser fiscalizadas em observância à ordem econômica e aos direitos dos consumidores. À União, por intermédio da Anatel, cabe a fiscalização, dada a obrigação legal que lhe é instituída. E a União necessita da Agência forte. Do contrário...

 

 

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Comentário de Henrique J. G. Ulbrich

Reduzir custos, sim. É saudável para qualquer empresa. Porém, da forma como está sendo feito, é um grande equívoco: demissões de profissionais capacitados e produtivos, que são admitidos depois como terceirizados, com sensível redução de ganhos e, muitas vezes, sob condições humilhantes de trabalho! E o que é pior, para obter a máxima redução de custos, contratam iniciantes em detrimento de profissionais experimentados. É coisa do tipo: vamos arriscar para ver, se der certo estamos economizando. Se der errado, o assinante está pagando a conta do mesmo jeito!!! Senti tudo isso na pele.

 

E continuo batalhando, dando murro em ponta de faca. E o que é pior, sendo maltratado em minha conta telefônica, com cobranças absurdas, pela empresa que poderia me acolher em seus quadros e se benefiar da minha experiência. É uma via de mão única! Para tudo há limite, inclusive racional. E esse limite já foi ultrapassado há muito tempo pelas "operadoras". Realmente, a análise feita no presente artigo é reveladora. Pena que a insensibilidade dos "executivos" das operadoras e a omissão verificada pelo lado do governo não estão contribuindo em nada para eliminar ou, pelo menos atenuar, essa distorção.

 

 

Comentário de João Batista Moreira Marques

Grande Juarez, bom dia. Vou dar minha opinião, mas antes faço uma pergunta. Quem criou a terceirização? Porque foi permitida a mesma, mesmo sabendo-se o preço que iriamos pagar? Antes que seja tarde demais, vamos criar uma lei proibindo a terceirização de uma vez por todas, e acabar essa exploração que só serve para elevar lucros e sucatear os sistemas de qualquer área. Grato pela sua atenção.

 

 

Comentário de Leandro da Silva

Em resumo, as operadoras focam no aumento de sua base de clientes e simplesmente o colocam de lado. Infraestrutura pobre e sem atualização, insatisfação e reclamação é o que mais se encontra em todos os cantos.

 

 

Comentário de Frank Akihiro Vieira Takeda

Como empresa contratada para terceirizar as vendas no porta-a-porta, deixo minha sugestão para que se haja um compromisso na absorção dos funcionário das contratadas sendo incorporado o INSS e FGTS na transferência no caso de uma reversão/cancelamento do contrato por motivos de exigência da Anatel/Aneel.

 

 

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