17/01/2005

Em Debate Especial: Balanço da Regulamentação de Telecomunicações

 

Balanço da Competição na Regulamentação das Telecomunicações

 

 

Silvia Regina Barbuy Melchior

Um balanço da Lei Geral de Telecomunicações (Lei 9.472/97, doravante LGT), para ser assertivo, passa necessariamente pela aferição e análise dos resultados obtidos até hoje frente aos objetivos primordiais que haviam sido assinalados na Exposição de Motivos que a embasou.

 

Por outro lado, não se pode afastar a análise da LGT e do setor de telecomunicações da interface que mantém com outras esferas especialmente no aspecto tributário e de infra-estrutura (legislações federais, municipais e estaduais).

 

Por essa razão a abordagem se dá em dois capítulos diferentes.

 

1. A LGT e sua atualidade

 

Da Exposição de Motivos que acompanhou e fundamentou a aprovação pelo Congresso Nacional da LGT, extraímos alguns aspectos fundamentais.

 

Os vetores da Emenda Constitucional nº 8/95, que abriu caminho para a propositura da LGT e permitiu que a exploração dos serviços de telecomunicações fosse delegada à iniciativa privada modificando totalmente o paradigma existente, foram:

  1. a globalização da economia;
  2. a evolução tecnológica; e
  3. a rapidez das mudanças no mercado e nas necessidades dos consumidores.

Havia a necessidade de adotar uma regulamentação que permitisse que as operadoras pudessem reagir rapidamente aos imperativos do mercado e da evolução tecnológica, oferecendo assim toda a gama de serviços de telecomunicações exigida pela sociedade. Para tanto a regulamentação existente que se inseria num contexto monopolístico, já que somente o Estado prestava o serviço, foi radicalmente alterada para permitir o ambiente de competição. Isso está claro na página 9 da Exposição de Motivos:

 

“Para isso, é necessário que o arcabouço regulatório de telecomunicações evolua de modo a colocar o usuário em primeiro lugar; o usuário deverá ter liberdade de escolha e receber serviços de alta qualidade, a preços acessíveis. Isso somente será possível em ambiente que estimule a competição dinâmica, assegure a separação entre o organismo regulador e os operadores, e facilite a interconectividade e a interoperabilidade das redes. Tal ambiente permitirá ao consumidor a melhor escolha, por estimular a criação e o fluxo de informações colocadas à sua disposição por uma grande variedade de fornecedores. Ao mesmo tempo, as regras da competição deverão ser interpretadas e aplicadas tendo em vista a convergência das novas tecnologias e serviços, a liberalização do mercado, o estímulo aos novos fornecedores e a intensificação da concorrência internacional. Deverão também ser estimuladas as modalidades de cooperação entre prestadores de serviços que visem aumentar a sua eficiência econômica e o bem estar do consumidor, adotando-se, entretanto precauções contra o comportamento anticoncorrencial, particularmente o abuso de poder pelas empresas dominantes no mercado”.

 

De forma específica a Exposição de Motivos, em capítulo próprio, apresentou os objetivos do novo modelo do setor:

  1. Fortalecer o papel regulador do Estado e eliminar seu papel de empresário: contempla a orientação de que o Estado promoverá um grau adequado de supervisão sobre o setor, de modo a assegurar que sejam alcançados os objetivos essenciais da reforma, a criação de um mercado de competição efetiva e a proteção dos consumidores contra comportamentos anticoncorrenciais;
  2. Aumentar e melhorar a oferta de serviços;
  3. Em um ambiente competitivo, criar oportunidades atraentes de investimento e de desenvolvimento tecnológico e industrial: nesse objetivo consolidam-se três intenções básicas: a primeira delas associa-se à necessidade de atração de capitais privados através da criação de oportunidades para investimento no setor, a segunda diz respeito à construção de um ambiente que propicie o desenvolvimento da competição justa no mercado e facilite a consolidação de novos participantes, e finalmente, a terceira refere-se à geração de condições que estimulem a pesquisa e o desenvolvimento tecnológico e industrial;
  4. Criar condições para que o desenvolvimento do setor seja harmônico com as metas de desenvolvimento social do País;
  5. Maximizar o valor de venda das empresas estatais de telecomunicações sem prejudicar os objetivos anteriores.

A tônica final é OPÇÃO ao consumidor a PREÇOS ACESSÍVEIS. Isso só se alcança em ambiente competitivo. Do ponto de vista econômico é pacífico o entendimento de que somente um ambiente concorrencial pode proporcionar queda de preços em grau superior ao da intervenção estatal por meio da regulação.

Pode-se dizer com isso que em última instância o modelo proposto na LGT explicitado na Exposição de Motivos prevê uma evolução de um patamar de intervenção elevada para intervenção mínima do órgão regulador, sempre tendo em vista a garantia de um ambiente que proporcione efetivamente ganhos ao consumidor. Para tanto o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência deve exercer papel fundamental em conjunto com a Agência para permitir e fomentar o desenvolvimento de um ambiente competitivo afastando as práticas predatórias.

 

No entanto, o cenário de intervenção mínima só é possível num ambiente em que de fato existam as regras que permitam a competição. Antes disso, há que se criar as condições de regulação, monitoramento de comportamento e aplicação de sanções que de fato permitam a existência da competição.

 

É inegável que a competição é efetivamente o caminho escolhido pelo novo modelo para embasar e alcançar todos os demais objetivos propostos na Exposição de Motivos:

 

“Ela (sic. a reforma proposta pela Emenda Constitucional nº 8/95 e LGT) visa alterar profundamente o atual modelo brasileiro de telecomunicações, de forma que a exploração dos serviços passe da condição de monopólio à de competição e que o Estado passe da função de provedor para a de regulador dos serviços e indutor das forças de mercado, fazendo, ao mesmo tempo, com que o foco da regulamentação seja deslocado da estrutura de oferta de serviços, como era tradicional, para os consumidores desses serviços. Adicionalmente, pretende-se criar um ambiente de estabilidade regulatória que estimule investimentos no setor.”

 

Por um lado houve aumento significativo no acesso da população aos serviços básicos de telecomunicações, mas contrastando com os objetivos originários da LGT temos uma divergência quanto à opção de operadoras e preços, especialmente no serviço telefônico fixo comutado e serviço de acesso à Internet, que afetam a grande maioria da população e do mercado corporativo composto por pequenas e médias empresas.

 

Não há duvidas de que a liberalização do mercado de telecomunicações transformou um setor tradicionalmente caracterizado exclusivamente por monopólios em um regime dinâmico. Alguns serviços de telecomunicações de fato experimentam a competição e o consumidor já frui das benesses que ela traz. Não obstante os avanços alcançados, este processo não está concluído de forma a permitir o benefício pleno aos usuários especialmente no que tange aos serviços mais populares: o serviço telefônico fixo comutado e acesso à Internet. Esse desvio se deve em grande parte por problemas relacionados à infra-estrutura de telecomunicação e nos serviços de acesso vinculados ao relacionamento entre operadoras, razão pela qual é preciso ainda investir no processo de fortalecimento da concorrência.

 

Ao analisar o setor de telecomunicações vê-se claramente que a regulação do relacionamento operadora – consumidor encontra grande detalhamento, monitoramento e fiscalização por parte da Agência. Mas a opção de serviços, prestadores, qualidade e preço dependem da existência de outras operadoras. É exatamente nesse ponto que a regulação e intervenção da Agência entre os agentes do mercado (relacionamento operadora – operadora) não se encontra no mesmo patamar de evolução.

 

A realidade é que o mercado das telecomunicações permanece fragmentado e dominado pelos operadores históricos, ainda monopolistas e que tendem a expandir o monopólio. A verticalização ocorrida no setor e a inexistência de regras que permitam o crescimento em real regime de competição dos mercados adjacentes em que atuam e do acesso às infra-estruturas essenciais são fatores que precisam ser revistos e imediatamente corrigidos pelo Poder Público.

 

É preciso que ao modelo da LGT, um primor de saber teórico, seja dado sentido prático efetivo no que concerne à sua premissa básica. Decorridos quase 8 anos da edição da LGT verifica-se descompasso na ação da Agência e do próprio ministério ao qual incumbe editar a política de telecomunicações, na implementação do modelo traçado, sendo necessária uma correção de rota emergencial.

 

A retomada do sentido primordial da LGT para que sua implantação seja completa passa por reconhecer que há monopólio tanto no serviço telefônico fixo comutado que está se expandindo para outros serviços relacionados, como no acesso à infra-estrutura essencial e de difícil duplicação, sendo que ambos refletem imediatamente no usuário final e afastam o alcance do objetivo de construir um mercado concorrencial. É recomendável uma revisão ou complementação da regulação e de processos de fiscalização e monitoramento de mercado.

 

Entre as recomendações práticas debatidas no setor destacamos:

Portanto, ao questionar sobre a atualidade da LGT, entendo que não se pode deixar de mencionar por um lado que a LGT contempla a possibilidade de um mundo convergente (mesmo porque podem ser criados novos serviços e extintos os velhos, sem uma modificação da lei propriamente) e por outro não foi plenamente implementada em um de seus aspectos estruturais.

 

O que precisa ser revista é a regulamentação do setor fundamentada na LGT.

 

Inegável por fim, que a própria LGT está também preparada para um ambiente de intervenção mínima que é em última instância o objetivo almejado.

 

2. O setor de telecomunicações e suas interfaces

 

A ampliação dos serviços de telecomunicações passa não só por uma complementação da regulação existente, específica para o setor, mas por uma re-avaliação da carga tributária incidente sobre o serviço. Telecomunicação é insumo para todas as atividades econômicas e gera benefícios de forma ampla na sociedade. A redução de sua carga tributária propiciaria certamente um aumento de produtividade de outros setores e deve ser buscada incessantemente, não obstante a sanha arrecadatória vivenciada.

 

Na mesma seara tributária se encontra o re-investimento dos recursos do FUST, também prioritário. A sua retenção por anos apenas leva à conclusão ou de que o fundo é desnecessário ou a sua retenção é ilegal e que deve ser rechaçada.

 

Por fim, a infra-estrutura de telecomunicações do país está ameaçada pela inexistência de uma coerência jurídica na sua legislação e clareza quanto às competências. Assiste-se impunemente à criação por Estados e Municípios de legislações que contrariam frontalmente a política nacional de telecomunicações ou ainda a interferência de outros órgãos que impõe condições inalcançáveis para a implementação de redes de telecomunicações.

 

Portanto a construção de um país conectado e com acesso universal aos serviços de telecomunicações não só depende da LGT e da regulação setorial, mas de uma revisão eficaz desses aspectos mencionados que afetam diretamente o seu sucesso.

 

 

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