26/07/2010
Forum Regulatório
Nesta página: Artigo de Silvia Melchior, advogada, sobre o Serviço de Comunicação Multimídia.
Serviço de Comunicação Multimídia
Por uma banda larga plena
Silvia Regina Barbuy Melchior
Advogada
O Serviço de Comunicação Multimídia ou SCM é o serviço propulsor da banda larga. Embora seja muito mais do que a prestação de serviço de banda larga, pois implica muitos outros serviços, é por meio dele que as empresas prestam o serviço ao usuário final e foi ele o serviço pensado originalmente pela Agência – Anatel – para ser a outorga convergente.
Essa conclusão está inclusive na análise empreendida pela Anatel por ocasião da apreciação do primeiro regulamento de SCM, a Resolução nº 272, de 09 de agosto de 2001 e seu Anexo1, ocasião na qual a Superintendência de Serviços Privados esclarece que “a elaboração da versão atual proposta surgiu da necessidade de se tratar de forma mais abrangente o fenômeno da convergência, pelo qual diversas formas de sinais representando dados, voz, imagens, sons e vídeo são transmitidos utilizando diversos meios de telecomunicações como radiofrequências, fios, meios óticos ou qualquer outro processo eletromagnético.”
É exatamente este o serviço base, que está subjacente ao Plano Nacional de Banda Larga e é ele que já está sendo disseminado para toda a população. Veja, que na Finlândia o direito de acesso à internet em alta velocidade tornou-se um direito de todos os cidadãos a partir de 1º de julho deste ano.
No entanto, aqui no Brasil, o seu usuário está exposto e sem ver garantido direito assegurado na própria Lei Geral de Telecomunicações, ou seja, o de comunicar-se com usuários de outras redes (sejam fixas ou móveis ou mesmo SCMs).
Essa deficiência existe mesmo nos casos em que existem contratações de serviços entre operadoras para resolver o problema, porque tais contratações não estão plenamente asseguradas em regulação e portanto sem qualquer garantia quanto à continuidade ou mesmo à estabilidade das mesmas, visto que a própria Agência tem entendido que algumas formas de contratação, embora sem serem vedadas legalmente, não seriam válidas.
Do ponto de vista lógico uma rede de telecomunicações só faz sentido se ela permite que seus usuários possam se comunicar plenamente com usuários de outras redes (o cliente de uma empresa com outra, o do serviço fixo com o móvel, etc..).
Daí porque a Lei Geral de Telecomunicações (Lei nº 9.472/97 – LGT) garante esse direito, como se verificará abaixo. Se um determinado sistema está impedido de realizar comunicação com outro, o resultado é que se formarão redes isoladas e sem integração o que fragmentaria toda comunicação do país.
Mas o que garantiria efetivamente o direito do usuário? A plena interconexão. Ocorre que para que esta seja possível é necessário que o serviço possua recursos de numeração (ou seja, cada usuário teria um código de acesso que permitiria identificá-lo numa comunicação com outras redes e serviços ou no recebimento de um determinado pacote ou chamada). Até hoje o SCM não tem recursos de numeração ou mesmo garantia para se comunicar com outras redes como as móveis e fixas.
O PGR - Plano Geral de Atualização das Regulamentações no Brasil - aprovado pela Resolução nº 516, de 30 de outubro de 2008, publicada em 11 de novembro de 2008, faz constar especificamente do item V.20 o Plano de Numeração do SCM e as regras de remuneração de redes, como ações necessárias a serem implementadas no curto prazo (até dois anos, que se encerram em 10/11/2010).
Nesse contexto, é imprescindível que a Agência ao menos termine a regulamentação do serviço outorgando aos seus usuários o que lhes é de direito, ou seja, o de se comunicar com usuários de outras redes, através da interconexão.
Sob essa ótica é necessário o avanço do regulamento vigente para contemplar essa perspectiva, direcionando esforços para trazer plenas habilidades do serviço para o cidadão que contrata a banda larga e quer fazer uso da voz sobre IP. Caso contrário, estar-se-á criando cidadãos com acesso a um serviço capenga, que se mantém isolados e que só podem se comunicar com usuários da mesma rede que a dele e que não têm garantia efetiva de ter o seu direito garantido.
Imprescindível afirmar que essa situação não é nova. A Resolução n.º 272, de 9 de agosto de 2001, que traz anexo o regulamento do Serviço de Comunicação Multimídia, já previa a edição do referido plano que até hoje carece de regulação:
“Art. 5º A utilização de recursos de numeração pelas redes de suporte à prestação do SCM é regida pelo Regulamento de Numeração, aprovado pela Resolução n.° 83, de 30 de dezembro de 1998 e pelo Plano de Numeração do SCM.” Estando previsto na norma desde 2001, não é mais uma faculdade da Agência, na medida em que as autorizadas passam a ter o direito ao que está legalmente previsto.
Mas não só as operadoras têm esse direito, o usuário também o tem, pois é elemento essencial para que possa haver a interconexão de redes. Assim, os Recursos de Numeração, conforme definido no art. 4º, inciso VII, da Resolução 272/01 são:
“Recursos de Numeração: conjunto de caracteres numéricos ou alfanuméricos utilizados para permitir o estabelecimento de conexões entre diferentes terminações de rede, possibilitando a fruição de serviços de telecomunicações;”
E o Termo de Autorização do SCM, assim como o próprio Regulamento do SCM estabelecem:
“4.1. O assinante do SCM tem direito, sem prejuízo do disposto na legislação aplicável:
I – de acesso ao serviço, mediante contratação junto a AUTORIZADA;
II – ao tratamento não discriminatório quanto às condições de acesso e fruição do serviço;
III – à informação adequada sobre condições de prestação do serviço, em suas várias aplicações, facilidades adicionais contratadas e respectivos preços;”
Nem é preciso descer a minúcias de regulamentos, pois ainda que não previsto em regulamentos da Anatel há que ser fornecido o recurso de numeração para o SCM já que a Lei Geral de Telecomunicações assim dispõe:
Art. 19. À Agência compete adotar as medidas necessárias para o atendimento do interesse público e para o desenvolvimento das telecomunicações brasileiras, atuando com independência, imparcialidade, legalidade, impessoalidade e publicidade, e especialmente:
XIV - expedir normas e padrões que assegurem a compatibilidade, a operação integrada e a interconexão entre as redes, abrangendo inclusive os equipamentos terminais;
Art. 146. As redes serão organizadas como vias integradas de livre circulação, nos termos seguintes:
I - é obrigatória a interconexão entre as redes, na forma da regulamentação;
II - deverá ser assegurada a operação integrada das redes, em âmbito nacional e internacional;
Art. 147. É obrigatória a interconexão às redes de telecomunicações a que se refere o art. 145 desta Lei, solicitada por prestadora de serviço no regime privado, nos termos da regulamentação.
Art. 151. A Agência disporá sobre os planos de numeração dos serviços, assegurando sua administração de forma não
discriminatória e em estímulo à competição, garantindo o atendimento aos compromissos internacionais.
Ora do exposto é evidente que os recursos de numeração são necessários e fundamentais à fruição plena do serviço e à interconexão.
Portanto, a omissão da Anatel está afrontando a própria Lei Geral de Telecomunicações, além do direito do assinante do serviço, de forma que não há mais o que esperar.
Sem dúvida nenhuma a popularização da banda larga como serviço acaba por expor essa fragilidade profunda do SCM que somente será sanada com a definição para esse serviço de seu Plano de Numeração e remuneração pelo uso de redes.
É mais do que hora de aproveitar a revisão da regulamentação prevista no PGR para editar o Plano de Numeração respectivo, o qual certamente deve ser compatível com a natureza do serviço. Evidentemente que o Plano de Numeração implicará a necessária manifestação sobre a remuneração pelo uso de redes, não se podendo perder de vista que deveremos evoluir para uma nova noção relacionada a dados para que atenda a natureza do SCM.
Referências
1Análise nº 079/2001-GCTC apresentada em 06/07/2001 – "Do Histórico".
Comente!
Para enviar sua opinião para publicação como comentário a esta matéria para nosso site, clique aqui!
Nota: As informações expressadas nos artigos publicados nesta seção são de responsabilidade exclusiva do autor.
Parabéns a Silvia pelo excelente artigo. Faz-se necessário definir que é "banda larga" na visão do PNBL e todos os parâmetros técnicos como latência, velocidade, jitter, disponibilidade, etc, não somente do acesso local como também do backbone Internet envolvido. Sem essa definição receio que o dinheiro do contribuinte gasto nesse projeto será pouco ou nada proveitoso.
Alerto também para a manutenção de uma infra-estrutura como esta, que, se olharmos como parâmetro os serviços públicos atuais teremos aí uma rede dispendiosa, lenta e utilizada somente por quem não tem outra alternativa. O PNBL tornaria-se o encalço Plano Nacional da Banda Lenta.
Muito bom seu esclarecimento Silvia. Mas creio que não se trata de uma omissão da Agência, e sim, uma complexidade para garantia da qualidade do serviço. Para obterem um plano de numeração, estas operadores no mínimo terão que garantir metas de qualidade assim como existe no STFC.
Como garantir a qualidade, se o protocolo VoIP não têm preferência no tráfego de dados da rede mundial? Creio que esta questão será resolvida apenas num longo prazo, já imaginou o lobby das concessionárias?
Newsletters anteriores
Mais Eventos
Mais Webinares